I Wanna Go Back: Saxon – Destiny [1988]

I Wanna Go Back: Saxon – Destiny [1988]

Por Diogo Bizotto
No decorrer das últimos artigos desta coluna, tentei de algumas maneiras explicar no que consiste o gênero AOR e o porquê dele, na minha opinião, constituir não exatamente um rótulo com suas especificidades, mas uma sonoridade que pode ser encontrada em artistas aparentemente díspares, mas que trazem em comum características que o aproximam, seja na execução ou na produção.

É por isso que hoje trago um álbum de uma banda que, certamente ao se mencionar o termo AOR, não surgiria à mente da grande maioria das pessoas. O Saxon, mais que uma banda de heavy metal, sempre foi sinônimo de NWOBHM (New Wave of British Heavy Metal), e é, junto ao Iron Maiden e ao Def Leppard, testamento vivo da longevidade desse movimento, trabalhando ininterruptamente há mais de 30 anos e vendendo milhões de discos ao redor do mundo. Que o Def Leppard sofreu fortes mudanças desde meados dos anos 80 e afastou-se da  sonoridade mais típica da NWOBHM que o lançou em primeiro lugar, é de comum conhecimento. O Iron Maiden que no ano passado lançou The Final Frontier também difere muito daquela formação que, contando com Paul Di’Anno nos vocais, lançou os hoje clássicos Iron Maiden e Killers.

Desses três principais representantes do gênero, o Saxon é certamente o que se manteve mais constante em termos de manter seu estilo inicial, calcado em um heavy metal com fortes influências rock ‘n’ roll. Mas mesmo assim, passeando pela extensa discografia de estúdio do grupo, é fácil perceber que mesmo o Saxon passou por fases distintas e lançou álbuns consideravelmente diferentes entre si. Do início infectado por influências rock ‘n’ roll, principalmente em seu primeiro álbum, auto-intitulado, passando para uma época essencialmente heavy metal, em especial após a entrada do baterista Nigel Glockler, culminando nos álbuns Power and the Glory e Crusader. Mas em 1985, em alta após o lançamento de diversos álbuns bem-sucedidos em sequência, a banda resolveu gravar uma obra que cedia, ao menos em parte, às tendências mais comerciais que assombravam o rock pesado na época, lançando Innocence Is No Excuse, que apesar de contar com diversas ótimas músicas, possui uma produção mais polida, trazendo uma proximidade com a sonoridade AOR à qual me referi no início do texto. As vendas do álbum ficaram abaixo das expectativas do quinteto, culminando na saída do baixista Steve Dawson, um dos membros fundadores. No entanto, não é exagero dizer que Innocence Is No Excuse deixou para a posteridade um dos grandes clássicos do grupo, e um exemplo da perfeita união entre o heavy metal e o AOR, a espetacular “Broken Heroes”, climática canção que, mais que investir em riffs de guitarra, trouxe uma nova dimensão ao som do Saxon.

Em 1986, contando com o vocalista Biff Byford no baixo, o grupo lançou Rock the Nations, um álbum que puxou o freio das mudanças que haviam ocorrido em Innocence Is No Excuse, calcando-se em uma sonoridade mais próxima da tradicional, apesar da presença de influências hard rock, explicitadas em faixas como a que empresta o título ao álbum, típica para se executar em uma arena lotada. Mesmo assim, Rock the Nations não recuperou o status do grupo, que inclusive contou com a participação especial do popstar Elton John em duas faixas. Enquanto Paul Johnson chegou para ocupar a posição de baixista, já que Biff havia realizado este trabalho apenas em estúdio, o baterista Nigel Glockler deixou o Saxon para se juntar ao GTR, projeto que envolvia os guitarristas Steve Howe e Steve Hackett, do Yes e do Genesis, respectivamente.

Saxon em 1988: Paul Quinn, Nigel Durham, Biff Byford, Graham Oliver e Paul Johnson

Imagine-se no lugar dos membros originais do Saxon, Biff, Paul Quinn (guitarra) e Graham Oliver (guitarra): com um álbum mais ao gosto norte-americano a banda viu, especialmente no Reino Unido, uma grande parcela dos fãs torcendo o nariz. Lançando outro mais próximo de suas raízes, o grupo não recuperou sua credibilidade e inclusive se saiu comercialmente pior. Qual seria o próximo passo? Como recuperar o status perdido conciliando credibilidade e sucesso?

É aqui que chegamos a Destiny. Quem pensava que o Saxon tentaria um decisivo retorno ao estilo de sua época mais áurea, se enganou feio. Se em Innocence Is No Excuse a banda já havia flertado com uma sonoridade mais comercial e uma produção mais polida, em Destiny o grupo mergulhou de cabeça na sonoridade mais AOR, injetando teclados em suas faixas como nunca havia se escutado antes, além de investir forte em canções mais calcadas em melodias grudentas, como comentarei a seguir. No lugar de Nigel Glockler entrou o baterista Nigel Durham, quase 15 anos mais novo que os membros fundadores do quinteto.

O álbum surpreende já na primeira faixa, trazendo um cover para “Ride Like the Wind”, sucesso do cantor pop norte-americano Cristopher Cross. Quem pensa que isso é um demérito está muito enganado. A canção original, carregada no piano e na percussão, aqui se transforma em um hard rock energético, com guitarras ao mesmo tempo pesadas e polidas, com direito a bons solos de guitarra e um Biff Byford em ótima performance, ajudado por backing vocals como poucas vezes havia sido antes. Foi produzido um videoclipe para essa faixa, e através dele se pode notar que inclusive no visual os membros de Saxon tentaram se conformar à realidade da época, incluindo cabelos mais esvoaçantes, como os grupos de pop metal tão em voga na época.

“Where the Lightning Strikes” é aberta por um riff de guitarra, que logo é acompanhado por um andamento mais quadrado. A bateria, bastante elevada na mixagem, é um reflexo de sua época, carregada de eco, em especial na caixa, soando mais alta que a maioria dos outros instrumentos. Os backing vocals aparecem com força, presença que se tornaria constante no decorrer do álbum. Se ainda não haviam aparecido evidências tão fortes de que o Saxon havia “farofado”, como dizem os detratores, em “I Can’t Wait Anymore” elas aparecem já na introdução, onde uma melodia grudenta é executada na guitarra, abrindo espaço para uma linha vocal melódica, cantando sobre uma base rica em teclados, com guitarras mais leves, sem investir em riffs, configurando-se em uma balada bastante típica à época. Reforçando a ideia de que o quinteto tentava uma última cartada em solo norte-americano, a faixa também recebeu um videoclipe, em uma versão ainda mais polida, suprimindo algumas linhas de guitarra na mixagem e elevando o volume dos teclados. Atitude certamente questionável, mas que serviu para ensinar uma lição ao grupo, já que Destiny foi outro fracasso comercial. Contudo, trata-se de uma boa música.

Um pouco do peso original é recuperado na direta “Calm Before the Storm”, que conta com um bom riff principal e mais uma das belas linhas vocais de Biff, que, gostem ou não do álbum, oferece em Destiny uma de suas melhores performances vocais de sua carreira. O excesso de teclados, no entanto, acaba “limpando” demais uma faixa que poderia ter ainda mais destaque. Em uma veia  mais épica vem “S.O.S.”, que, com seus efeitos emulando o barulho do vento e do oceano, versa sobre o desastre ocorrido com o navio transatlântico Titanic, que naufragou em 1912, configurando-se em uma das maiores tragédias marítimas já registradas. Apesar de ser uma faixa hoje em dia um tanto ignorada por banda e fãs, não faz feio em comparação a outros épicos da banda, como “Crusader”, trazendo riffs cavalgados e estrofes bem construídas.

Pôster promocional de Destiny

Segunda balada do disco, “Song For Emma” abre com teclados e guitarras dedilhadas, além de mais uma bela melodia executada na guitarra solo. Biff canta de maneira menos rasgada que a habitual e consegue fazer com que um refrão a princípio bastante simplório fique registrado na mente do ouvinte. A faixa mais pesada do álbum surge na forma de “For Whom the Bell Tolls”, iniciada com um excelente riff de guitarra que se repete no decorrer da música, que traz vocais mais agressivos que a média do disco e um refrão que, carregado em backing vocals, culmina no entoar de seu título, seguido pelo riff principal da canção. Sem dúvida trata-se da faixa que mais lembra o Saxon de anos atrás, com menos teclados e com guitarras “na cara”, incluindo solos curtos e de bom gosto.

O ponto mais fraco de Destiny encontra-se em “We Are Strong”, que abre com um riff de teclado de fazer corar a mais farofenta banda de hard rock de Los Angeles. A música não é de todo ruim, mas parece uma tentativa de criar um hino a ser entoado pelos fãs durante os shows do grupo, fato que imagino não ter se concretizado. As estrofes até soam interessantes, mas o exagerado refrão cantado sobre o citado riff de teclado definitivamente não funciona. “Jericho Siren” traz o heavy metal de volta, e mesmo recebendo a polida produção de Stephan Galfas, tem nas guitarras seu principal trunfo, executando bons riffs e solos. Na mesma veia, a acelerada “Red Alert” encerra o álbum, animando o fã que poderia estar decepcionado com algumas das faixas anteriores, trazendo guitarras um pouco mais ríspidas, mas sem chegar perto de clássicos como “Machine Gun” e “Motorcycle Man”.

De maneira alguma considero Destiny um de meus álbuns favoritos do Saxon. Essa honra pertence à fantástica trinca Wheels of Steel (1980), Strong Arm of the Law (1980) e Denim and Leather (1981), clássicos que uniram o heavy metal do Saxon à uma pegada rock ‘n’ roll carregada de malandragem que jamais se repetiria posteriormente. No entanto, trata-se de um bom álbum, contando com algumas faixas que sem dúvida merecem uma chance no set atual do grupo. Por mais que não traga o Saxon em seu ápice, Destiny não é merecedor de todas as críticas que recebe, possuindo características positivas, como a boa performance vocal e o esforço em criar boas melodias. Farofa, purpurinado? Talvez, mas mesmo assim é Saxon e digno de atenção.

15 comentários sobre “I Wanna Go Back: Saxon – Destiny [1988]

  1. Pessoal… recebemos algumas reclamações de leitores do blog que consideram que o tamanho da fonte que usamos é muito pequeno, então estou fazendo um teste nessa postagem para saber se desse jeito a legibilidade fica melhor. Fico no aguardo dos comentários a respeito do assunto.

    Ah, e sobre o disco do Saxon também!!!

  2. Nunca tive problemas com a leitura, e só posso dizer que sim, ficou maior. Não consegui ler o texto ainda, mas é uma baita banda e me surpreende estar aqui no I Wanna Go Back!

  3. Acho que o tamanho da fonte foi aprovado por todos não é? Já programei novo texto utilizando esse novo tamanho e acho que vai se tornar padrão para as postagens daqui em diante.
    Estou certo?

  4. Desculpem mudar de assunto, mas queria falar sobre o post.
    Não conheço o disco em questão. Do Saxon, conheço apenas o Crusader e acho muito bom! Mas a discografia anterior a este já tá no forno pra eu ouvir!
    Só uma dúvida: uma banda da NWOBHM faz farofa, e isso é AOR?

  5. Pois é Groucho, eu estou com esse mesmo dilema. Tenho no Saxon de Eagle Has Landed uma das melhores citações para a NWOBHM, e agora, o Diogo me surge com ese disco de AOR. Ainda não tomei coragem para baixar e ouvir.

  6. Ufa, até que enfim alguém me apoiando, hehehe… Eu penso que o Saxon de maneira alguma deixou de ser uma banda de heavy metal em "Destiny", mas a execução e especialmente a produção na maioria das faixas o caracterizam sim como um disco com muito de AOR. E sim, isso já ocorreu com outras bandas originárias da NWOBHM. Quem ainda tem dúvidas dê uma conferida nos vídeos que linquei.

  7. Para começar, a sorte do Diogo é ter dito q a trinca essencial são os melhores. Ao ver Destiny em um topico AOR quase infartei. Depois de algum tempo me preparando psicologicamente, baixei o disco e ouvi. Cara, o que o Diogo escreveu é quase 100% real. for whom the bell tolls é muito boa (tirando o refrão). I can't wait anymore e We are strong são dois pesadelos farofa. Jericho tem uma guitarra bem legal, e se não fossem as vocalizações cantando o nome da canção, iria ser a melhor faixa, principalmente pelo baixao. Calm before the storm já eh mais uma bombinha nivel 2, muito farofa e com uns tecladinhos terriveis. Red alert é a melhor, baita música, baita solo de guitarra, e nao tem teclados. Ride like the wind é de correr aos que são apaixonados por Eagle Has Landed, eita vocalizações ridiculas e seu MEXICO!! Where the lightining strikes já é mais acessivel, tirando o refrao. SOS é outra bomba de alto quilate. Compará-la com Eagle Has Landed é mais ofensivo que ver a Tiazinha na época forte dela, de pernas abertas, nua, depiladinha e cherosinha, e gritar "Q NOJO, BARANGA". song for emma é boa o inicio, o resto, eita baladinha chata.

    Enfim, ainda bem q só ouvi esse disco agora, pq se não, jamais teria conhecido o inicio do grupo, q eh bem melhor q essa bomba!

    1. Sou um fã de hard rock e aor e esse álbum do saxon eu acho muito bom. Em especial i cabt wait anymore. Recomendo

  8. Muito legal seu texto.
    Coloquei a bolacha pra rodar enquanto lia, e devo dizer que foi muito interessante.
    Comecei até a gostar um pouco do álbum. Red Alert é muito boa, e eu nem lembrava dela.
    parabéns pelo texto.

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